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eu e bete2 anos de Casamento (9 fotos)
Hoje, 16 de abril de 2013, Eu e Elizabete Toledo, fazemos dois anos de casamento, mas na verdade, já são mais de 3 anos juntos. E pasmem, hoje à meia-noite, nos cumprimentamos super apaixonados, e acordamos pela manhã, do mesmo jeito … rsrsrs … te amo gata. Feliz Dia.

E tudo porque eu consegui dar continuidade à Recuperação. Tudo porque eu consegui chegar à Serenidade diária. Tudo porque Deus trouxe mais um anjo para me resgatar.

Relatar o próprio sofrimento pode ser errado em alguns momentos, mas na saída do inferno, é inevitável. Todos fazem isso. E é estranho o Paraíso, depois que se fica fora dele por muito tempo. Contudo, essa é a parte mais fácil. Se readaptar ao Bem e à Paz é bem mais simples e gostoso .. rsrs … obrigado Senhor.

E mais uma vez, trago algo para que eu nunca me esqueça onde começou minha Redenção, e quais são meus Limites. Assim Seja. Paul Sampaio.

Edição do dia 14/04/2013

14/04/2013 21h03 – Atualizado em 15/04/2013 09h46

‘Não quero continuar sendo escravo da droga’, diz Casagrande

Na semana passada, o ex-jogador lançou um livro contando a sua história.

A semana foi marcada por um ilustre e querido personagem: Walter Casagrande Júnior, também conhecido como Casão,  ex-jogador  e comentarista de futebol da Rede Globo.

Na última terça-feira (9), Casagrande lançou um livro contando a sua história. Uma história muito dura mas com final feliz.

Num depoimento honesto e revelador, Casagrande conta ao Fantástico como desceu até o fundo do poço das drogas.  E como foi que voltou, para contar essa história.

“O túnel do dependente químico é longo, muito longo e escuro. Mas tem uma luz lá no fundo do túnel, lá tem uma luz. É que você não vê, você não consegue enxergar a luz, porque você está tão envolvido com a droga e você precisa de uma chacoalhada pra acreditar que tem uma luz, aí você começa a ver e você vai ao encontro dela. Por que que eu ia guardar esse segredo pra mim, meu?

O relato é de um homem famoso que usou drogas e preferiu não se calar. Nessa entrevista ao Fantástico, Casagrande respondeu a todas às perguntas.

“Por eu ter sido atleta e de ponta, treinava muito, ter uma resistência física muito boa, era difícil me dar pane, era difícil alguma droga me tirar do controle, do uso, do efeito dela. Eu sempre achava que eu podia um pouquinho mais. Medicamentos com álcool, junto com cocaína, junto com droga injetável, fazia essas misturas constantemente”.

Walter Casagrande Júnior completa 50 anos amanhã e tem muito pra contar. O comentarista de futebol se expôs publicamente, na biografia lançada esta semana: “Casagrande e seus demônios”.

“Eu tinha visões horríveis, tudo parecia muito real, via demônios pelo apartamento inteiro. Eram maiores do que eu, com dois ou três metros de altura. Isso durou um mês, sei lá, um mês e meio,
eu entrei em surto psicótico pelo uso exagerado de drogas e privação de sono”.

“Eram sensações mesmo, sensações, ver vultos ou olhar pro sofá da sala e ver o sofá num formato que tinha que ter um formato ali, alguma coisa tava sentado ali, sabe. A parte que você senta afundada, marcas no braço do sofá”.

O livro fala das overdoses de Casão, como ele é conhecido. Em uma das vezes que passou mal, um dos três filhos estava em casa. Os dois se preparavam pra jantar fora, quando Casagrande usou cocaína e heroína.

“Eu ia usar e eu não ia poder sair com ele, não ia dá pra sair com ele, foi droga injetável, não ia dá, ele ia sair do banheiro e eu ia ta completamente transtornado, ia falar pra ele: ‘mano, não vou jantar mais’”.

“Botei tudo de uma vez, rapidamente, pois o Leonardo estava em casa e podia aparecer a qualquer momento. Houve uma explosão no meu peito. Explodiu mesmo: buumm. Saí cerca de um metro do solo , bati contra a parede e caí no chão”

“Uma das piores situações que eu passei do envolvimento meu com a droga foi desse dia”, conta Casagrande.

Um acidente de carro no dia 22 de setembro de 2007, um sábado, obrigou Casagrande a parar com as drogas.

“Eu adormeci numa descida e o meu pé caiu do acelerador, eu acelerei, capotei com o carro, quando eu acordei eu estava no Hospital Einstein, a primeira vez, quando eu acordei a segunda vez eu tava internado na clinica. Foi a virada aí da historia. E qual é a conclusão que eu chego disso daí? Era o seguinte: aquele sábado era o limite. Alguma coisa tinha que acontecer”, conta.

A internação numa clínica de recuperação para dependentes químicos aconteceu sem que ele soubesse. A autorização foi assinada pelo filho mais velho dele, seguindo o aconselhamento dos médicos.

“Foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida e o melhor que poderia ter acontecido naquele momento”, admite.

Repórter: Você tentou até que meio um jeito de sair de lá.

“É, não foi acreditar, foi não aceitar. Eu não aceitava estar lá, não aceitava que eu era doente, meu pensamento era ainda aquele de um dependente químico em atividade – ah, amanhã eu paro, eu paro quando eu quiser, não preciso estar internado aqui, se eu não quiser usar amanhã eu não uso – que é uma bobagem, mentira, você está dominado pela droga, é tudo justificativa de um dependente químico”, diz.

“De fato, eu entrei no tratamento, fiz tudo direitinho, comecei a acreditar nos psicólogos e naquilo que eles falavam pra mim”, diz um trecho do livro.

Ele teve de esperar oito meses pra receber a primeira visita da família – os três filhos.

“Foi engraçado ver o jeitão deles assim, são três caras, um mais fechadão, um pouco mais agressivo comigo, o outro bem paizão. Filho, mas com comportamento de paizão, compreensivo  e tal. Foi legal”, diz.

Depois de um ano, Casão voltou à vida do lado de fora da clínica.

“O meu suporte atrás foi o trabalho, eu não tenho dúvida disso. A família ajudou? Ajudou! Tive o apoio dos lados da família. Quando eu caia para um lado tinha os meus pais, quando eu caía pro outro lado, tinha os meus filhos, os amigos, mas as minhas costas tava apoiada na TV Globo”, afirma.

O livro também relembra os bons momentos do ex-atacante, que já jogou no São Paulo, no Flamengo, em times da Europa. A estreia como profissional no Corinthians em 82 foi um sucesso. Ele fez quatro, dos cinco gols do time.

“Tudo que eu fiz naquele jogo, deu certo. Tudo, sabe, tudo. Era uma coisa tão absurda que chegou uma hora no segundo tempo, eu já tinha feito os 4 gols eu olhava para o time do Corinthians assim, eu comecei a ficar constrangido”, lembra.

No futebol, Casão encontrou um grande companheiro: o doutor Sócrates. “Sem dúvida foi meu maior parceiro no futebol. Quando eu era juvenil no Corinthians, eu o tinha como ídolo e costumava ficar ao lado do campo para vê-lo nos treinamentos do time profissional”, lembra em outro trecho do livro.

“Nós tínhamos mesmo um complemento muito forte, o meu jeito de jogar, o meu modo de pensar, futebolisticamente falando, completava o modo dele e era um gênio do futebol, um cara genial que fazia coisas fantásticas que você menos esperava”, afirma Casagrande.

O amigo Sócrates morreu em dezembro de 2011. O álcool levou o ex-jogador à morte. Casagrande conseguiu se despedir dele do jeito que queria.

“Eu tive a intuição e veio a vontade de olhar pros olhos dele e dizer: ‘Magrão, eu te amo cara. Você foi um dos caras mais fantásticos que eu conheci’. E saber isso aí me alivia. Não é uma coisa que é simples de falar, não é uma coisa que é simples de ouvir, não é uma coisa que é simples de lembrar, porque eu gostaria muito de lembrar disso que eu estou te falando e sair daqui e tomar uma cerveja com o Magrão e dizer assim: o Magrão, eu te amo ainda, entendeu. E eu não posso mais”.

Hoje Casagrande conta com a ajuda de três psicólogas e uma psiquiatra.

“Minha vida mudou muito. E não é que ela mudou por obrigação; mudou porque ela mudou mesmo, no jeito. Hoje eu vivo bem sozinho, entendeu? Antes eu não suportava o meu jeito, então eu saia muito, eu tava muito na rua, eu tava, eu usava ate droga para dar uma congelada no emocional mesmo, conseguir me suportar e tal”.

Eu quero viver como eu vivo hoje. Eu só não quero continuar sendo escravo da droga.
Fantástico: Você não leu o seu livro ainda?
Casagrande: Não, ainda não li.
Fantástico: Por quê?
Casagrande: Não li porque não me dá coragem ainda de algumas histórias. Eu quero pegar e ler, do início ao fim. Eu não quero pegar os capítulos. Eu podia muito bem ler os capítulos leves, ouvir as brincadeiras que eu fazia com os meus amigos na minha adolescência, ver as brincadeiras que eu fazia com o Paulo Roberto que jogava comigo no Corinthians, Paulo Roberto jogava no Grêmio, enfim, eu podia fazer isso, mas é, eu estou curioso também pra ver, para ler as partes ruins da minha vida. Eu ainda não tenho coragem.

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Despertou sem noção de nada. Olhou para o teto, para as paredes do quarto, para as coisas ao seu redor, não reconheceu
o ambiente. “Onde estou?”, perguntava-se. ainda sob efeito
da medicação que havia tomado, e que só agora começava a se dissipar, sentia certa confusão mental. aos poucos, procurou organizar
os pensamentos e reconstituir os últimos acontecimentos de que se
lembrava para tentar entender o que fazia ali. Tinha vaga ideia de
que sofrera um acidente, fora levado ao Hospital das Clínicas e pedira transferência para o albert einstein. Porém, decididamente, não
estava lá — um local que conhecia tão bem. esperava ver alguém da
família a seu lado, mas se encontrava sozinho.
“acordei num lugar estranho, não sabia se era são Paulo, se estava no Brasil, qual a direção em que ficava, eu não sabia nada”,
recorda-se. Os terapeutas da clínica lhe davam poucas explicações
nesse primeiro momento, e ele só conseguiu entender melhor o que
se passara bem mais tarde. “eu estava muito frágil, então não tinha
nem forças para me revoltar. só depois de algum tempo, quando comecei a melhorar fisicamente e a recuperar a sanidade, passei a entrar
em conflito, porque achava que não tinha de ficar lá.”
após dois, três meses, tornara-se extremamente impaciente. em
sua avaliação, já que permanecera todo aquele tempo sem usar
droga, estava “limpo” e pronto para regressar à vida normal. não
compreendia que o seu grau de dependência exigia tratamento
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prolongado. Manifestava preocupação com seu trabalho, alegava
que iria perder o emprego, precisava cuidar da família, dos filhos.
“Isso martelava na minha cabeça, e eu insistia nesses pontos com
os médicos. Mas se eu não havia pensado em tudo isso antes, por
que iria ficar preocupado a essa altura, internado na clínica? era
um pretexto para sair de lá.”
a resistência ao tratamento durou quatro meses. Um tempo interminável, no qual se sentia preso e se desesperava por não poder
se encontrar ou falar com nenhum integrante da família. Completamente isolado do mundo externo, não tinha meios sequer de pedir
ao filho mais velho, Victor Hugo, e à sua mãe para tirá-lo da clínica.
Um dos motivos da privação de contato é justamente esse. se pudesse conversar com eles, as chances seriam grandes de convencê-los de
que já superara o problema. Lançaria mão de todos os argumentos
e artifícios: chantagens emocionais, mecanismos para despertar o
sentimento de culpa dos parentes, promessas enfáticas de que nunca
mais voltaria a usar drogas, o alto custo mensal da internação, enfim,
tudo isso, aliado ao seu inegável poder de sedução, faria qualquer
pessoa querida fraquejar.
em dado momento, resolveu jogar pesado. “Parei de pagar a mensalidade na tentativa de ser mandado embora.” recusando-se a assinar o cheque, completou dois meses de inadimplência. e foi assim
que um dos psicólogos que cuidavam dele o chamou para uma reunião: “Você vai sair daqui, continuar naquele ciclo vicioso e, em breve, regressar para cá? Ou vai se tratar até receber alta e ter uma vida
normal lá fora?”, perguntou. O ultimato deu resultado. ele resolveu
acertar as contas e prosseguir com a internação. além de ouvir os
argumentos do terapeuta, tinha consciência de que sua família não
permitiria passivamente aquela ruptura unilateral.
Cansado de dar murros em ponta de faca, Casagrande por fim
capitulou. Percebeu que a única maneira de sair de lá seria aceitar
o tratamento. Mas não mudou de postura meramente como uma
estratégia em busca da liberdade. além da conclusão lógica de que
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sua resistência só iria estender o período de internação, convenceu-
-se da necessidade de isolamento e da terapia em período integral,
longe das armadilhas da vida cotidiana.
“Foram as duas coisas. de fato, eu entrei no tratamento, fiz tudo
direitinho, comecei a acreditar nos psicólogos e naquilo que eles
falavam para mim. se eu tivesse feito um jogo apenas para sair da
clínica, me fingindo de bonzinho para ter alta, hoje estaria com o
mesmo comportamento de antes. Percebi, ali, uma oportunidade
para me transformar como ser humano”, explica.
a partir desse momento, permaneceria mais oito meses internado,
totalizando um ano na clínica, com rotina extremamente rígida. as
suas obrigações diárias deviam ser cumpridas à risca, sob pena de
sofrer punições e descer alguns degraus na, digamos, escala evolutiva
— o que só acarretaria privações adicionais e deixaria a meta mais
distante. a programação de deveres seguia padrão quase militar, tamanho o rigor da disciplina imposta aos internos.
assim, acordava todos os dias, impreterivelmente, às sete horas.
Quinze minutos depois, já tinha de regar a horta, uma das funções
atribuídas a ele no início do tratamento, juntamente com outro paciente. em seguida, das 7h45 às 8h25, praticava educação física. O
café da manhã era servido pontualmente às 8h30. nessa primeira
fase, cabia a ele a tarefa de tirar a mesa do café. Às 9 horas, formava
um grupo de cinco internos e voltava para a horta a fim de limpar
os canteiros. “Para mim, era um saco”, confessa. “Mas fazia parte
do processo de tratamento para desenvolver a humildade. O dependente químico se torna um tanto prepotente, porque a droga o leva
a não cumprir obrigações.”
durante meses, precisou se dedicar a esses serviços. Também arrumava a sala de reuniões de grupo, à tarde. Tirava todas as cadeiras, passava pano no chão, organizava as prateleiras de livros, assim
como os jogos e materiais de terapia. Tudo isso tinha de ser realizado
em quinze minutos. se não concluísse dentro do tempo estipulado,
perdia pontos, necessários para obter recompensas.
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O sistema de pontuação semanal vai de zero a dez. Quem não
atinge seis, por exemplo, fica sem refrigerante no fim de semana,
quando os internos têm direito a duas latinhas. Para receber visita,
regalia restrita àqueles que estão em fase avançada do tratamento,
é necessário somar pelo menos sete pontos. Cada passo do paciente é avaliado e levado em consideração. existem regras em todas as
atividades: no fumódromo, não é permitido se comunicar com os
colegas, nem por gestos. Qualquer desvio provoca perda de pontos.
de acordo com a gravidade do erro, há punições mais severas,
como o confinamento no quarto. Casagrande experimentou tal castigo, durante 24 horas, por ter tentado passar o número do telefone
de sua mãe ao irmão de um paciente. “Queria que ele ligasse para ela
e pedisse para me tirar de lá, dissesse que eu estava desesperado para
sair.” Conforme o caso, o isolamento pode durar mais, meses até.
essa linha de tratamento é bastante contestada por psiquiatras e
psicólogos adeptos de outras correntes terapêuticas. Mas, embora
tenha discordado de algumas punições desse tipo, ao longo de sua
permanência na clínica, Casagrande acabou por entender a necessidade de ações mais duras em determinadas situações. “Há pessoas
que não têm condições de conviver com outras durante um período
de crise. O método da clínica inclui atividades em conjunto; então
não pode ter ninguém remando contra a corrente.”
Os casos de dependentes que ficam confinados por longos períodos causam mais contestação. a impressão é de que se trata mais
de uma prisão do que uma clínica destinada à sua recuperação. “É
cruel, tem gente que fica seis, sete meses isolada do convívio com os
demais. Mas, ao mesmo tempo, vejo que a clínica precisa tomar alguma atitude para a pessoa cair na realidade. Quem apresenta um
quadro de agressividade fica separado até se enquadrar.”
esse não era o caso de Casão. ele nunca apresentou comportamento agressivo ou reagiu com violência, nem quando estava sob
efeito de drogas, muito menos durante a internação. aliás, cabe aqui
uma correção. Casagrande — o comentarista popular e ex-jogador
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de futebol — jamais foi paciente da clínica. Quem estava lá era o
Walter. Todos os internos e funcionários só o chamavam assim, pelo
primeiro nome. Uma forma de humanizar o personagem e tirar a
aura criada pela fama.
“O fato de ter começado a manter contato com o Walter me mostrou o quanto ele estava doente, tinha problemas emocionais e se
escondia atrás do Casagrande. Hoje, eu sou o Walter a maior parte do tempo, e de uma forma legal. Um cara que cuida das pessoas
queridas e dele próprio, com consciência da doença e do tamanho
do problema que pode causar a si mesmo”, assegura.
Passaram-se sete, quase oito meses, para que Walter ganhasse sinal verde para receber visitas. durante esse período, ele passava por
tratamento e os familiares também. Precisaram ser preparados para
lidar com aquela situação complexa. dona Zilda sofria profundamente. afinal, ela e Victor Hugo haviam dado o aval para a interna-
ção involuntária do filho.
“a minha maior angústia era não ter ideia de como ele iria reagir
quando se encontrasse na clínica e soubesse que eu havia assinado
o documento para a internação”, afirma dona Zilda. “Ficamos sete
meses sem poder falar com ele. nós só o observávamos por um vidro, pela janela de uma sala, mas ele não nos via, nem sabia que estávamos lá. era uma aflição.”
Todos precisaram de muita paciência. além da distância da famí-
lia, Walter sofria com a privação de contato feminino. “Fiquei um
ano sem sexo e, pior, sem carinho ou qualquer tipo de amor. não se
pode nem encostar em uma mulher.” a clínica comportava 32 pacientes, homens em sua maioria. “Havia poucas mulheres lá dentro e,
ainda assim, eu as olhava só como outras pessoas doentes, como eu.”
não havia espaço, ali, sequer para amizades. Os internos são
monitorados o tempo todo, para evitar a formação de grupos ou
panelinhas. Por isso foi um alívio quando as visitas começaram a
ser permitidas. ainda que os encontros fossem breves, sempre com a
mediação de um terapeuta, já eram uma referência afetiva, e traziam
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com eles um pouco de sua história. “Foi muito emocionante meu
primeiro contato com o Victor, o Leonardo e o symon. eu já havia
entendido que meus filhos tinham feito o que era melhor para mim.
a minha relação com eles, hoje, é ótima.”
Mesmo na condição de ex-mulher, Mônica também participou
do processo terapêutico. “ela demonstrou preocupação, interesse,
carinho e afeto por mim”, reconhece Casagrande. Os dois mantêm
uma relação relativamente amigável, com uma ou outra discordância, como é comum em separações conjugais.
eu mesmo tive a oportunidade de encontrá-lo na clínica, em sua
primeira visita depois das dos familiares. ele havia engordado vinte
quilos e voltara a se parecer com a imagem consagrada do personagem Casagrande. sempre sob a supervisão de um terapeuta, fiz uma
longa entrevista com ele, publicada no Diário de S. Paulo em 27 de
julho de 2008. naquela ocasião, também conversamos, pela primeira
vez, sobre a proposta da globo Livros de contarmos a sua história.
ele ficou animado com o projeto e pediu ao psicólogo que o acompanhava para buscar um livro no quarto. Quando voltou, me presenteou com a autobiografia de eric Clapton. estava empolgado com o
que lera sobre o ídolo do rock e do blues, a quem sempre admirou.
Havia ganhado o volume de quatrocentas páginas na festa de
amigo secreto, no fim do ano anterior. ele próprio escolhera aquele
presente, escrevendo seu desejo num papelzinho, colocado junto com
os outros pedidos dos demais participantes. O paciente que o tirou
como amigo precisou primeiro submeter a sugestão ao corpo clínico.
depois da aprovação, pediu a um familiar para comprar o livro —
era assim que funcionava a troca de presentes no natal.
Casagrande se inspirava na biografia de eric Clapton por se tratar de um dos monstros sagrados do rock que haviam sobrevivido
ao uso pesado de drogas. a maioria de seus ídolos morrera jovem,
de overdose: Jim Morrison, Janis Joplin, Jimi Hendrix… durante
muito tempo, cultivara certa atração por aquele fim fatal, como se
fosse seu destino cumprir a sina de viver intensamente e morrer até
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os trinta anos — uma ideia juvenil lançada nos anos 1960 por Mick
Jagger, que, ironicamente, envelheceu nos palcos sem perder a energia. a trajetória revelada por Clapton, que superara a dependência
de heroína, cocaína e álcool, abria agora uma nova janela. Muito
mais ensolarada.
diante de seu entusiasmo com a oportunidade de também revelar
ao mundo sua saga, combinamos que faríamos juntos o projeto do
livro tão logo ele saísse da internação. Mas seria preciso controlar a
ansiedade. Walter só receberia alta em outubro daquele ano. além
disso, descobriria, ao ser posto na rua, que existia muita coisa a reparar em sua vida, antes de mais nada.
atvglobo havia mantido seu contrato em vigor durante o longo
período de afastamento, pago normalmente seu salário e lhe dado
todo o apoio para o tratamento. no momento em que Walter voltasse a ser Casagrande, teria a obrigação moral de honrar a confiança
depositada nele e seguir o roteiro estabelecido pela emissora para
o retorno gradativo às transmissões. Também precisaria filtrar, pelo
menos por algum tempo, o círculo de amizades — para minimizar o
risco de sofrer recaída. e o mais importante de tudo: precisava se reaproximar dos filhos e saldar a dívida afetiva contraída com a família.

Escrito por Paul Sampaio

PAUL SAMPAIO CHEDIAK ALVES é professor, locutor, apresentador de rádio e TV, web designer e o criador da REDE SAMPAIO de Sites.